Por: José Morais
Fotos: enviadas por Flávio
Simão
A aldeia de “Salvador”, sempre teve a tradição das “Janeiras” depois
de se ter deixado o ano velho, entrava-se no novo ano, onde o tempo era de
cantar as “Janeiras”, e para
celebrar as mesmas, juntavam-se grupos de tocadores e cantadores de ambos os
sexos, onde graúdos e pequenos se manifestavam espontaneamente, naquela que era
uma das principais tradições portuguesas, muito em especial da Beira Baixa.
As “Janeiras” são celebradas no primeiro mês de cada ano, e eram cantadas de porta a porta, principalmente no primeiro dia do novo ano, e na véspera do dia de Reis, sendo uma tradição muito antiga, que remota de tempos muito difíceis dos mais necessitados, em séculos passados, onde a fome e a miséria existia no povo, altura em que as terras pertenciam a uma minoria muito pequena dos mais pobres, e onde no inverno, a estação do ano onde a produção de alimentos que a terra dava era mais reduzida, e martirizava o povo mais desprotegido, tendo o mesmo de recorrer à mendicidade, para poder sobreviver.
Assim, as “Janeiras” foi
a forma que o povo encontrou para poder chegar aos senhores abastados, onde
eram louvadas as suas qualidades humanas, tentando assim que os mesmos lhes
dessem algo de esmola.
Porem, com o passar dos
tempos, e onde a pobreza ia diminuindo, e a fome ia sendo reduzida, as “Janeiras” foram
evoluindo, tornando-se em peditórios, tentando angariar alguns produtos, os
quais no final de cada dia que andavam de porta a porta a cantar as “Janeiras”, o grupo juntava-se para fazer uma
divertida pândega com o que tinham angariado.
Os grupos percorriam a aldeia
de uma ponta à outra nas noites geladas de janeiro, onde eram escolhidas as
casas de balções altos, e dos senhores mais abastados, onde paravam, e cantavam
as canções tradicionais a pedir as “Janeiras”,
entoando quadras que vinham de tempos remotos, onde o seu tom de respeito e
louvor ilustravam bem o mesmo.
Deixamos agora aqui as ditas
quadras tradicionais da nossa aldeia de “Salvador”
…
Inda agora aqui cheguei,
Já pus o pé na escada:
Logo o meu coração disse
Que aqui mora gente honrada.
Viva lá minha senhora,
Raminho de salsa crua.
Quando chega à janela,
Poe-se o sol e nasce a lua.
De quem é aquele chapéu,
Que além está dependurado?
É do dono desta casa,
Que é bonito como um cravo!
Levante-se daí senhora,
Desse banquinho de prata.
Venha-nos dará as Janeiras,
Que está um frio que mata:
Alegrai-vos companheiros,
Que eu já sinto gente a andar:
É a senhora desta casa,
Que nos vem a convidar.
Boas noites, meus senhores,
Boas noites vimos dar,
Vimos pedir as Janeiras,
Se nos as quiserem dar.
Viva lá ó senhor António,
Raminho de bem querer.
Traga a chave da adega,
Venha-nos dar de beber.
Ó que estrela tão brilhante,
Que nos vem a alumiar.
É a senhora da casa,
Que está sentada a fiar.
Levante-se daí senhora,
Desse banco de cortiça.
Venha nos dar as Janeiras,
Ou morcela ou chouriça.
Obrigado e até pró ano,
Que havemos de voltar.
Agora vamos embora,
Que temos muito que andar.
Estas eram as belas quadras cantadas para todos aqueles que abriam as
suas portas e doavam bens, porem…existia também sempre uma segunda opção, esta
que era dedicada aos senhores abastados mais forretas e agarrados, sendo uma
forma de punir os mesmos, aqueles que ignoravam, e recusavam abrir as suas
portas, e dar algo para quem cantava as “Janeiras”, onde os grupos cantavam assim também uma
bela quadra de repudio…
Ó que casa tão alta
Toda feita de madeira.
Aos senhores que cá moram,
Deus lhes dê uma caganeira.
Esta, uma tradição que a nossa aldeia de “Salvador” ainda mantem, porem, noutros moldes, e com outra alegria.
Bem-haja a todos.
Nota: Este artigo possui alguns excertos do livro “Salvador Barquinha D’Oiro”, cedido
gentilmente pelo nosso conterrâneo “Albertino
Calamote”, o qual agradecemos a sua gentileza, obrigado.